O próximo governo conseguirá cumprir as promessas de campanha?

Por Carlos Gilbert Conte Filho

            Diante das dificuldades fiscais pelas quais atravessa o País, algumas das promessas feitas por Lula durante a campanha podem ter que ficar para um segundo momento. As promessas feitas durante a campanha foram audaciosas e necessitam de vultuosos recursos que estão muito distantes de se ajustar ao espaço fiscal previsto no Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) enviado pelo executivo ao Congresso Nacional em agosto. Sendo assim, qual é o tamanho do desafio que se impõe ao futuro governo e quais as alternativas para concretizar as promessas de campanha?

            Durante o pleito, Lula fez diversas promessas, dentre essas manter o Auxílio Brasil em R$ 600 e pagar um adicional de R$ 150 por criança; dar aumento real para o salário-mínimo e elevar a isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5.000 (atualmente a isenção vai até R$ 1.900). Essas são promessas que demandam um volume de recursos bastante grande. Analistas estimam a necessidade de cerca de R$ 175 bilhões. Acontece que no PLOA estão previstos apenas R$ 115 bilhões em despesas discricionárias. E, para pior a situação, o PLOA – do jeito que está – já prevê um rombo de R$ 63,7 bilhões. Ou seja, o novo governo terá de achar um jeito de acomodar cerca de R$ 123 bilhões que estão “a descoberto” até o momento. Isso sem falar nas verbas insuficientes para manter serviços públicos que tiveram o orçamento enxugados ao longo dos últimos anos como, por exemplo, a farmácia popular, a merenda escolar, o Casa Verde e Amarela, as universidades, a saúde etc. A título de exemplo, os recursos previstos no PLOA tanto a educação como a saúde são os menores desde 2014. Ou seja, também para esses serviços – já que o próximo governo tem uma mão mais aberta em questões que visam a melhoria da qualidade de vida da população, sobretudo da população carente – os recursos devem ser ampliados – o que amplia o desafio fiscal.

            Sendo assim, achar dinheiro para bancar os gastos prometidos será como tirar leite de pedra o que leva a crer que as promessas não poderão ser cumpridas de uma só vez. Com isso, a expectativa é de que algumas promessas devam ficar para 2024 (ou para ainda mais tarde). A mais provável é a mudança do IR tendo em vista que beneficiária, mais amplamente, a classe média do que as classes de renda mais baixas e que mais sofrem com a crise atual. É importante destacar que o foco número um do governo Lula – tal como prometido durante a campanha – é acabar com a fome e com a extrema pobreza no Brasil. Portanto, a prioridade é a manutenção do Auxílio Brasil em R$ 600. Apenas para não deixar passar batido, segundo o Banco Mundial, a extrema pobreza em nosso País (pessoas que ganham até R$ 10,90 por dia) atinge 1,95% da população, o equivalente a 4,14 milhões de brasileiros. Ademais, estima-se que, no Brasil, 1 a cada 3 brasileiros não fazem as três refeições diárias.

            Diante desse cenário, a equipe do próximo governo já trabalha a PEC da Transição e busca soluções para acomodar os gastos previstos. A PEC da Transição é uma proposta de emenda constitucional para reformar o orçamento, colocando uma série de despesas previstas fora do teto de gastos, principalmente o Auxílio Brasil (cujo gasto extra para contemplar os R$ 600 ante aos R$ 405 previsos no PLOA é da ordem de R$ 21 bilhões). Na prática, a aprovação dessa PEC permitirá ao governo gastar mais (o que também resultaria em mais dívidas). E o aumento da dívida é um outro tema que preocupa os analistas já que, entre 2020 e 2022, a dívida pública federal aumentou em mais de 35% (gráfico 1).

O próximo presidente ainda não definiu a equipe econômica, e a ausência do nome que irá assumir a pasta deixa os investidores com o pé atras. Contudo, o que é certo, é que 2023 será um ano de gastos elevados. A equipe que está realizando a transição entre o governo atual e o próximo ainda estuda como financiará a manutenção do Auxílio Brasil em R$ 600 – se por medida provisória ou por Proposta de Emenda a Constituição (PEC). Lembrando que, para um governo que não conta com a maioria da bancada no Congresso Nacional, aprovar uma PEC é um desafio bastante grande.

Fato é que Lula indicou que pretende eliminar o teto de gastos como regra oficial do País. O que os economistas esperam é que o presidente eleito formate uma nova política de gestão de gastos públicos a fim de trazer credibilidade aos planos econômicos e, com isso, não afugentar os investidores. Nesse sentido, é importante destacar que o presidente Lula tem um melhor trânsito no meio internacional do que Bolsonaro, o que pode (e deve) ser utilizado para atrair investimentos para o Brasil – mesmo ante a um maior endividamento público – contribuindo, assim, para ampliar o emprego e a renda por aqui. O desafio, portanto, é achar dinheiro sem assustar o mercado sob pena de que o dinheiro fuja do País e pressione ainda mais as contas públicas, o processo inflacionário, os juros e consequentemente o desempenho da economia daqui para frente.

Nesse cenário, controlar a inflação será um desafio ante a uma política fiscal expansiva (maior gasto e maior endividamento). Com um maior endividamento, os investidores entendem que, em um próximo momento, essa dívida terá de ser paga. E os maios para isso não são nada atrativos para quem deseja investir em terras tupiniquins (aumento de impostos ou aumento dos juros ou queda de investimentos em diversos setores, dentre esses em infraestrutura).

Acontece que o mercado não tem compaixão. O mercado apenas precifica. Nesse sentido, diante do cenário que se impõe e a expectativa de um possível descontrole fiscal em meio a um processo inflacionário que teima em não ceder – mesmo ante a uma taxa básica de juros elevada (13,75% ao ano) – o mercado projeta um desempenho bastante fraco para a economia brasileira nos próximos anos (gráfico 2).

Sendo assim, o que conseguimos observar até aqui, ainda que tenhamos mais dúvidas do que respostas, é que o ano que vem teremos uma política fiscal mais expansionista com mais gastos (provavelmente financiados por mais endividamento público). Portanto, é muito importante que o governo seja assertivo na comunicação junto ao mercado, o que passa pelo modo como vai mensurar e viabilizar os gastos que pretende realizar, evitando surpresas negativas que comprometam – ainda mais – o produto da economia no ano vindouro.

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