A sobretaxa dos EUA ao aço brasileiro
2025-02-27 18:02:41Por Carlos Gilbert Conte Filho
Desde que assumiu a Casa Branca, o presidente eleito Donald Trump tem decretado inúmeras tarifas de importação aos produtos oriundos do resto do mundo. Tal medida vem criando alvoroço nos mercados internacionais de comodities. No Brasil, a nova tarifa veio sobre o aço, um dos principais produtos brasileiros exportados para os EUA, e há a sinalização de que o mesmo deve ocorrer com o etanol. Deve-se ponderar, contudo, que as consequências de maiores tarifas de importações nos EUA não se limitam ao mercado direto em que incidem, mas geram diversas consequências para a nossa economia. Vejamos com pormenores.
Em fevereiro, com poucos dias de governo, o presidente americano assinou um memorando instruindo o Departamento de Comércio e outras agências a estudarem a implementação de tarifas recíprocas sobre produtos de países que aplicam taxas mais elevadas aos produtos americanos. Nesse sentido, o etanol brasileiro foi citado como exemplo, destacando que o Brasil impõe uma tarifa de 18% sobre o etanol dos EUA, enquanto os EUA aplicam apenas 2,5% de tarifa sobre o etanol brasileiro. Entretanto, e já concretamente, nossa economia é atingida por outra medida de ampliação das tarifas de importações americanas: 25% sobre as compras de aço brasileiro, a qual deve entrar em vigor já em março.
Os EUA são os maiores compradores do aço brasileiro, cujas exportações alcançaram os US$ 3 bilhões, em 2024. Não obstante, 20% do consumo de aço nos EUA tem como origem o Brasil. Por sua vez, o aço é o segunda commodity brasileira mais exportada para os EUA, ficando atrás apenas dos óleos e petróleo (tabela 1). Sendo assim, o fato de Trump ter sobretaxado o aço brasileiro significa um impacto estimado de até US$ 700 milhões nas exportações do Brasil.
Fato imperativo é que a taxa extra de 25% que os Estados Unidos cobrarão sobre a importação de aço vai pressionar a siderurgia nacional, que precisará se desdobrar para vender o excedente da mercadoria para outras partes do mundo, sob o risco de reduzir a produção e até de cortar empregos no setor. É de se esperar, portanto, que as empresas que atuam em território nacional – a Usiminas, a CSN e outras siderúrgicas com atuação mais local – terão impacto negativo em volume produzido e em preço. Para o restante da economia, a queda das vendas vai reduzir a circulação de dólares no Brasil, o que pressiona uma desvalorização do Real frente à moeda americana e, assim, impulsiona a inflação (já que diversos produtos e insumos ofertados no Brasil são de origem externa).
Em 2024, o Brasil exportou 5,8 milhões de toneladas de aço para os EUA. Produziu pouco menos de 80 milhões de toneladas, o que resultou em um nível de utilização da capacidade instalada das siderúrgicas de aproximadamente 74%. Ou seja, haveria a possibilidade de elevar a produção anual de aço para até 86 milhões de toneladas. A medida de Trump, portanto, vai pressionar as siderúrgicas que precisarão buscar novos mercados – como a China, Europa e o Mundo Árabe – para vender o excedente. É relevante destacar que, entre 2010 e 2024, as exportações de aço para os EUA cresceram 25,44% enquanto, no mesmo período, as exportações de aço para a China cresceram 73,31%.
É, portanto, imperativo que o aço brasileiro migre para outro mercado se não o americano. Se não houver um outro destino para o aço que não será consumido pelos EUA, o mercado interno dificilmente conseguiria absorvê-lo. Essa maior demanda interna dependeria de políticas públicas para incentivar a indústria, projetos de infraestrutura e do aquecimento da construção civil. O setor automobilístico também poderia absorver parte da produção, mas esse depende de incentivos governamentais para tanto. Sendo assim, o mercado interno de aço, que já está desaquecido, dificilmente absorveria essa maior oferta em nível doméstico.
Logo, o que surge no horizonte, ao menos no curto prazo, é que a produção nacional deve cair e as siderúrgicas precisarão cortar empregos. Um dos efeitos imediatos será a redução da produção de aço, o risco de desligamento de fornos e a demissão de trabalhadores, tal como ocorreu durante o primeiro mandato de Trump, quando esse também elevou as taxas sobre o aço.
Diante do cenário que se impôs, o governo federal interpretou os recentes anúncios do governo Donald Trump (EUA) de taxar o aço e o etanol brasileiro como um chamado a conversar, mas nos termos deles. Em outras palavras, na interpretação do Palácio do Planalto e do Itamaraty, o presidente republicano tenta forçar o Brasil a negociar. Mas, diferentemente da diplomacia tradicional, impõe tarifas e punições a seus parceiros antes de sentar-se à mesa.
Na esteira dos últimos ocorridos, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva prometeu reagir à taxação do aço brasileiro e, eventualmente, retaliar e taxa os produtos americanos, o que não parece ser a conduta mais acertada. Ocorre que se o Brasil responder, Trump pode retaliar com tarifas sobre outros produtos estratégicos, como o petróleo, a carne e aeronaves, o que afetaria outros setores da economia além do siderúrgico.
Resta saber, portanto, até onde vai essa onda tarifária de Trump: ela se restringirá a indústria do aço e do etanol, ou ainda atingirá outros mercados? Fato é que, nesse início de mandato, as medidas adotadas pelo novo presidente americano trazem dificuldades para economias exportadoras como a brasileira. Acredita-se, contudo, que tais medidas não terão fôlego para continuar na velocidade que estão acontecendo, uma vez que as consequências dentro dos EUA também serão incomodas a população: a taxação de produtos estrangeiros certamente fara com que os preços internos nos EUA aumentem.
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