As Novas Tarifas dos Estados Unidos e os Impactos no Brasil e no Mundo
2025-04-29 16:27:41Por Carlos Gilbert Conte Filho
Em janeiro de 2025, Donald Trump iniciou seu segundo mandato como presidente dos Estados Unidos e, nos primeiros meses, reacendeu tensões no comércio internacional. Com um discurso ainda mais forte em defesa da indústria americana e da soberania econômica, seu governo decidiu aplicar tarifas mais altas sobre produtos importados, atingindo quase todas as nações que vendem para os EUA.
A medida principal foi a imposição de uma tarifa mínima de 10% sobre todos os produtos que entram no país. Além disso, foram definidas tarifas ainda mais elevadas para países com os quais os Estados Unidos mantêm déficits comerciais. A China passou a enfrentar tarifas de até 145%, enquanto a União Europeia foi taxada em 20%, o Japão em 24% e o Vietnã em 46%. O governo americano justificou essas medidas como uma forma de proteger empregos e indústrias domésticas, combatendo o que considera práticas comerciais desleais por parte desses parceiros.
As decisões norte-americanas geraram reações imediatas no cenário internacional. A China, principal parceiro comercial dos EUA, respondeu aumentando significativamente suas próprias tarifas sobre produtos americanos, atingindo alíquotas de até 125%. México e Canadá, que compartilham o USMCA (acordo que substituiu o NAFTA), também anunciaram medidas de retaliação, reacendendo disputas que pareciam resolvidas.
Na Europa e na Ásia, governos passaram a discutir estratégias de defesa comercial conjunta, temendo o impacto das tarifas americanas sobre seus produtos. Organizações multilaterais como a ONU e o FMI emitiram alertas públicos, destacando que ações unilaterais dessa magnitude podem causar graves desequilíbrios econômicos, encarecer produtos, reduzir o investimento global e enfraquecer a cooperação internacional.
O impacto dessa guerra comercial foi sentido rapidamente nos mercados financeiros. O índice Dow Jones caiu 4.000 pontos em dois dias, um dos maiores recuos em curto prazo da história recente, refletindo o temor de uma recessão global. Empresas multinacionais, que dependem de cadeias globais de fornecimento, enfrentaram aumento nos custos de produção e dificuldades logísticas. Os preços dos produtos começaram a subir, alimentando um cenário de inflação global. Consultorias econômicas e bancos internacionais passaram a prever, com preocupação, uma possível recessão mundial até o final de 2025.
O futuro dessa guerra comercial ainda é incerto, mas as tendências observadas até agora indicam uma possível reconfiguração do comércio internacional. Se os Estados Unidos continuarem adotando uma postura agressivamente protecionista, é provável que mais países elevem suas barreiras comerciais em resposta, abandonando o modelo de comércio multilateral que vinha sendo fortalecido desde o pós-guerra. Esse movimento pode levar a uma maior regionalização das trocas comerciais, com países buscando segurança em acordos bilaterais ou em blocos regionais. Nesse contexto, a Organização Mundial do Comércio (OMC) – que tem a função de mediar disputas e garantir regras comuns –, encontra-se cada vez mais fragilizada, já que os próprios Estados Unidos continuam bloqueando a nomeação de juízes para seu órgão de apelação. Com isso, o risco de um comércio internacional mais fragmentado, descoordenado e assimétrico aumenta substancialmente.
Nesse cenário, a estabilidade global fica ameaçada. Países com economias mais frágeis podem sofrer com a perda de acesso a mercados, aumento da volatilidade cambial e fuga de capitais. Ao mesmo tempo, empresas multinacionais precisarão reavaliar suas cadeias de produção, o que pode gerar custos adicionais e atrasos no abastecimento de bens essenciais.
Embora o Brasil não esteja entre os principais alvos das tarifas mais elevadas, os efeitos indiretos sobre nossa economia são relevantes e preocupantes, principalmente no que diz respeito à inflação e ao desemprego. O aumento da tarifa mínima de 10% para os produtos brasileiros exportados aos Estados Unidos reduz a competitividade das mercadorias brasileiras naquele mercado, afetando setores como o aeroespacial, o siderúrgico, o têxtil e o agroexportador.
Empresas como a Embraer já alertaram para o risco de perda de contratos e aumento de custos logísticos. O setor de aço e alumínio, por sua vez, enfrenta novas barreiras semelhantes às do primeiro mandato de Trump, dificultando sua participação em cadeias produtivas globais. Essa retração nas exportações leva à redução na produção e nos investimentos, o que afeta diretamente o mercado de trabalho formal no país.
Segundo estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), uma queda de apenas 5% nas exportações brasileiras para os EUA pode resultar na perda de cerca de 90 mil empregos diretos e indiretos, especialmente nas indústrias e nos setores de transporte e logística. Paralelamente, o aumento da incerteza global tem provocado volatilidade cambial, com forte desvalorização do real. Isso encarece produtos importados como combustíveis, medicamentos, fertilizantes e eletrônicos, pressionando os preços internos e afetando tanto o consumo quanto a produção doméstica.
O Banco Central já indicou, em comunicados recentes, que a combinação entre choques externos, desvalorização cambial e incertezas fiscais deve manter a inflação acima da meta em 2025, com o IPCA podendo encerrar o ano entre 5% e 6%. Essa inflação reduz o poder de compra da população, compromete o consumo das famílias e desaquece a economia, além de pressionar a taxa Selic a permanecer em patamar elevado (o que encarece o crédito, especialmente para pequenas e médias empresas).
Com uma menor demanda, as empresas passam a contratar menos ou até demitir, o que pode elevar a taxa de desemprego para algo entre 8,5% e 9%, segundo projeções da Confederação Nacional da Indústria (CNI). O crescimento do PIB também tende a ser mais fraco. De acordo com o Boletim Focus do Banco Central, publicado no dia 7 de abril, a expectativa para o PIB, que era de 2,01% há duas semanas, passou para 1,97%, já indicando os primeiros reflexos da nova guerra comercial.
Setores mais vulneráveis à concorrência externa, como vestuário, calçados e manufaturados leves, enfrentam uma pressão dupla: ao mesmo tempo em que perdem espaço no mercado externo, sofrem com o aumento da concorrência no mercado interno, pois países asiáticos, bloqueados nos EUA, buscam novos mercados como o brasileiro. Isso amplia na ociosidade industrial e compromete a criação de empregos formais por aqui.
O agronegócio, embora com vantagem comparativa consolidada, também pode sofrer efeitos adversos. Produtos como soja, carne bovina, café, açúcar e suco de laranja estão sujeitos a oscilações de demanda externa e volatilidade de preços. Caso a China reduza suas compras ou redirecione suas importações a outros fornecedores, os produtores brasileiros podem ter suas margens comprimidas, o que compromete o investimento no campo e o dinamismo do setor.
A queda na atividade econômica também pressiona a arrecadação de impostos, limitando a capacidade do governo de realizar investimentos e atender às demandas sociais. Com menor receita e maior pressão sobre gastos obrigatórios, como o seguro-desemprego, a política fiscal se torna ainda mais restrita, criando um ciclo de estagnação que afeta tanto a gestão pública quanto o bem-estar da população.
Além disso, a incerteza prolongada afeta a confiança de consumidores e empresários. Indicadores como o Índice de Confiança do Empresário Industrial (ICEI) e o Índice de Confiança do Consumidor (ICC) têm registrado queda, sinalizando menor propensão ao consumo e ao investimento. Isso contribui para a retração da demanda agregada e para a desaceleração da atividade econômica.
Outro fator de preocupação é o impacto sobre o crédito. Se a inflação se mantiver pressionada, o Banco Central pode elevar ainda mais a taxa de juros, comprometendo o acesso ao crédito, sobretudo entre os pequenos negócios e consumidores de baixa renda.
Diante desse cenário global conturbado, o Brasil enfrenta desafios significativos, como a perda de competitividade internacional, a pressão inflacionária e o risco de aumento do desemprego, o que exige respostas coordenadas e eficazes. No entanto, essa crise também abre espaço para uma reavaliação estratégica do papel do País no comércio global. Ao diversificar suas parcerias comerciais, o Brasil pode reduzir sua vulnerabilidade externa e conquistar novos mercados. A guerra tarifária imposta pelos Estados Unidos, apesar de suas repercussões negativas imediatas, pode ser o catalisador para uma transformação econômica mais resiliente, dinâmica e voltada ao futuro. Cabe ao Brasil, portanto, transformar essa turbulência externa em impulso estratégico para uma nova fase de desenvolvimento baseada em maior autonomia, resiliência produtiva, inserção internacional qualificada, além de menos dependente da economia americana.
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