A Alta da Selic e Seus Efeitos na Economia Brasileira
2025-05-30 12:15:20Por Carlos Gilbert Conte Filho
A decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central de elevar a taxa Selic para 14,75% ao ano marcou o sexto aumento consecutivo da taxa básica de juros (gráfico 1). Trata-se do maior patamar desde julho de 2006. Essa elevação foi motivada principalmente pelo esforço de conter a inflação, que se mostra persistente e acima da meta estabelecida pelo regime de metas de inflação vigente no Brasil. O movimento é parte de um ciclo de aperto monetário iniciado no segundo semestre de 2024, diante do aumento das pressões inflacionárias causadas pela combinação de demanda interna aquecida, choques de oferta e incertezas no cenário global.
De acordo com a ata da reunião do Copom e os documentos de política monetária subsequentes, a decisão de elevar a Selic se baseou em um cenário caracterizado por inflação elevada, resiliência da atividade econômica, mercado de trabalho aquecido e política fiscal expansionista. A inflação corrente e suas projeções para os anos seguintes se apresentaram acima do intervalo de tolerância, cuja meta central para esse o próximo ano é de 3% ao ano podendo variar 1,5 ponto percentual para cima ou para baixo.
A conjuntura internacional também influenciou a decisão. A guerra comercial entre Estados Unidos e China, somada às tensões geopolíticas globais, criou um ambiente de maior volatilidade nos mercados e pressionou os preços de commodities. A política comercial protecionista dos EUA afetou o câmbio e elevou os riscos inflacionários para economias emergentes, como o Brasil. Além disso, a valorização do dólar frente às moedas de países em desenvolvimento encareceu importações, pressionando os preços internos de insumos e bens finais.
O Copom também ressaltou que as perspectivas para a inflação estão indefinidas. Entre os riscos de alta, destacam-se a possibilidade de desancoragem prolongada das expectativas, maior persistência da inflação de serviços e impactos cambiais duradouros. Entre os riscos de baixa, figuram uma desaceleração mais intensa da atividade doméstica e internacional e a queda nos preços das commodities.
A elevação da Selic afeta a economia por diversos canais. Primeiramente, o aumento da taxa básica encarece o crédito para famílias e empresas, reduzindo o consumo e o investimento. Em março de 2025, a taxa média de juros bancários para operações com pessoas físicas e jurídicas já estava em 44%, o maior nível em quase dois anos. O crédito ao consumo, especialmente financiamentos de longo prazo como veículos e imóveis, tende a desacelerar com esse encarecimento do custo do dinheiro.
Em segundo lugar, os juros altos agravam a situação fiscal, uma vez que aumentam o custo do serviço da dívida pública. Nos 12 meses encerrados em março, as despesas com juros do setor público chegaram a R$ 948 bilhões, o equivalente a 7,9% do PIB. Isso amplia o déficit nominal e aumenta a necessidade de emissão de títulos públicos, o que, por sua vez, alimenta as pressões por manutenção da taxa elevada.
A reação dos setores produtivos à elevação da Selic foi dividida. A Confederação Nacional da Indústria (CNI) e outras entidades industriais se manifestaram contrárias à medida. A CNI projeta que o PIB da indústria deve crescer apenas 2% em 2025, contra 3,3% em 2024, o que representaria o menor crescimento da economia nos últimos cinco anos. Para a entidade, a política monetária contracionista coloca em risco o emprego e a renda.
A Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan) e a Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg) também demonstraram preocupação com os efeitos recessivos da política de juros elevados, especialmente diante da queda nas commodities e da desaceleração global. Ambas defenderam uma condução mais equilibrada da política monetária, que concilie estabilidade de preços com estímulo ao crescimento e à competitividade.
No comércio varejista, a reação foi mais heterogênea. A FecomercioSP reconheceu a necessidade da elevação para conter a inflação de serviços, que permanece pressionada, mas ponderou que o aumento de 0,5 ponto percentual foi excessivo e que os efeitos acumulados das altas anteriores ainda não se manifestaram plenamente. Já a Associação Paulista de Supermercados (APAS) criticou a continuidade do ciclo de alta, argumentando que a decisão favorece o rentismo e desestimula o investimento produtivo, em contramão às tendências internacionais de estímulo à economia.
Além disso, entidades do setor de infraestrutura e construção civil alertaram para a redução no ritmo de projetos de investimento e financiamento habitacional, com impactos diretos sobre geração de emprego e crescimento regional. O setor de serviços financeiros, por sua vez, avaliou positivamente o impacto da Selic elevada sobre a rentabilidade dos investimentos em renda fixa e fundos atrelados a juros, mas alertou para o risco de migração de recursos do mercado acionário para produtos conservadores, o que poderia reduzir o dinamismo do mercado de capitais.
Segundo o Boletim Focus, divulgado em 12 de maio de 2025, o mercado financeiro projeta que a Selic permanecerá em 14,75% até o final de 2025. A partir de 2026, espera-se uma redução gradual, com a taxa atingindo 12,50%, e em 2027, 10,50%. A percepção do mercado é de que o Banco Central poderá manter os juros elevados por um período prolongado até obter sinais mais claros de desaceleração da inflação.
Quanto à inflação, a mediana das projeções para o IPCA de 2025 caiu de 5,53% para 5,51%, mas ainda está acima do teto da meta de 4,5%. Para 2026, a expectativa é de 4,5%, e para 2027, de 4,0% (gráfico 2). Já a projeção do próprio Copom para 2026 é de 3,6%, dentro da banda de tolerância, mas ainda distante da meta central. O maior peso no índice de inflação tem sido exercido pelo grupo de alimentação e bebidas, que em abril de 2025 respondeu por mais de 40% da alta do IPCA, com destaque para produtos como batata, tomate e café moído.
No que tange ao crescimento econômico, a estimativa para o PIB de 2025 é de 2,3%, abaixo dos 3,4% observados em 2024. Esse desempenho reflete a desaceleração da demanda interna e a retração dos investimentos, provocados pelo ambiente de juros altos e pela incerteza econômica global. O consumo das famílias, que vinha sendo o principal motor da atividade econômica, deve perder fôlego, enquanto os investimentos públicos enfrentam restrições fiscais e os privados, um custo de capital mais elevado.
A elevação da taxa Selic para 14,75% em 2025 representa uma resposta robusta do Banco Central ao desafio de reconduzir a inflação à meta, especialmente em um cenário econômico adverso. Embora a medida seja tecnicamente necessária para controlar a inflação, ela acarreta impactos significativos sobre a atividade econômica, o mercado de trabalho e as contas públicas. A disparidade de posicionamentos entre os diferentes setores produtivos ressalta a complexidade do dilema enfrentado pela política monetária brasileira, que precisa equilibrar o combate à inflação com a preservação do crescimento econômico.
Destaca-se, por fim, que as expectativas sugerem que o ciclo de aperto monetário pode estar próximo do seu término, embora a sua duração dependa da consistência na trajetória de queda da inflação e da avaliação dos riscos fiscais. Em última análise, a condução da política monetária exige não apenas prudência, mas também clareza na comunicação e coordenação estreita com a política fiscal, de modo a evitar um quadro de estagflação prolongada e garantir a recuperação sustentável da economia brasileira.
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