Efeitos do “Tarifaço” de Trump no Brasil e no Rio Grande do Sul
2025-08-29 10:17:53Em 2025, os Estados Unidos implementaram um amplo pacote de tarifas de importação que alterou de forma significativa o cenário do comércio internacional. Essa política foi inicialmente composta por uma tarifa-base de 10% sobre praticamente todas as importações realizadas pelos EUA, acompanhada de aumentos setoriais adicionais (como a elevação para 25% sobre aço e alumínio). No entanto, a partir de agosto de 2025, entrou em vigor uma tarifa de 50% sobre todas as importações de produtos brasileiros, ampliando de maneira expressiva o alcance e a intensidade do choque comercial. A medida representou uma escalada nas tensões bilaterais e gerou repercussões imediatas nos mercados pressionando setores estratégicos e acentuando incertezas econômicas.
O objetivo deste texto é, portanto, examinar de forma detalhada os efeitos da nova política externa dos EUA em relação ao Brasil e, em particular, sobre o Rio Grande do Sul. A análise contempla os canais de transmissão da medida para a economia, identifica os setores mais impactados, avalia as consequências para o comércio exterior e a competitividade e discute possíveis estratégias de resposta tanto no âmbito empresarial quanto na política econômica. Vejamos.
A nova política tarifária americana foi originalmente estruturada em dois pilares. O primeiro consistia na tarifa-base de 10%, anunciada em abril de 2025 e aplicada de forma ampla a quase todas as importações. O segundo envolvia medidas adicionais e ajustes específicos, como a elevação para 25% sobre aço e alumínio, acompanhada de regras mais rígidas para comprovação da origem da produção. No entanto, em julho de 2025, o presidente Donald Trump anunciou um endurecimento sem precedentes nas relações comerciais, com a aplicação de uma tarifa de 50% sobre todos os produtos importados do Brasil, a vigorar a partir do início de agosto.
Em comunicado divulgado nas redes sociais, Donald Trump afirmou que a decisão se devia não apenas a supostos desequilíbrios tarifários e barreiras impostas pelo Brasil, mas também à postura do Supremo Tribunal Federal no julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro. Segundo ele, o processo contra Bolsonaro seria uma “caça às bruxas” e uma afronta à liberdade de expressão. Com base nesse conjunto de argumentos, anunciou a nova tarifa de 50% – a mais alta já imposta pelo governo americano contra o Brasil –, que ampliou as tensões diplomáticas e comerciais entre os dois países.
Na prática, tarifas desse porte funcionam como um pesado imposto de importação: encarecem substancialmente os produtos brasileiros nos Estados Unidos, reduzem volumes comercializados e alteram preços relativos, favorecendo a substituição por fornecedores domésticos ou de países com condições tarifárias mais vantajosas. O impacto imediato foi sentido nos mercados, com forte alta do dólar futuro e preocupações crescentes sobre os efeitos adversos na balança comercial e nas exportações brasileiras.
Os canais de propagação do “tarifaço” na economia brasileira são múltiplos. O mais evidente é a perda de competitividade em preço, que encarece os produtos brasileiros para o consumidor americano. Outro é o desvio de comércio, com exportações sendo redirecionadas para outros mercados. Há ainda possíveis repercussões nos termos de troca e nos preços internacionais, já que tarifas dessa magnitude podem influenciar as cotações globais de commodities e manufaturas. A incerteza provocada pela medida também tende a adiar investimentos, reconfigurar cadeias produtivas e estimular a transferência de parte da produção para locais mais próximos dos EUA ou para países com relações comerciais privilegiadas. Além disso, choques dessa natureza repercutem no câmbio, afetando o real por meio da interação entre fluxos financeiros e comerciais.
Os Estados Unidos ocupam posição central na pauta comercial, sendo o segundo principal destino dos produtos brasileiros (ficando atrás apenas das exportações para a China). Em 2024, as exportações para os EUA somaram cerca de US$ 40 bilhões, com forte presença de bens industriais e de algumas commodities. Apesar dessa relevância, a balança comercial bilateral tem sido deficitária para o Brasil de forma praticamente contínua desde 2007 – resultado que contraria a narrativa do presidente Donald Trump, segundo a qual os Estados Unidos estariam sendo prejudicados no comércio com o Brasil (conforme ilustrado no gráfico 1).
Diante do cenário que se impôs, é provável que, no curto prazo, haja redução dos volumes exportados para os Estados Unidos nos setores mais expostos. Parte dessa perda poderá ser compensada por uma eventual desvalorização do Real, pela diversificação de mercados e pela maior agregação de valor a produtos voltados a nichos específicos. No médio prazo, empresas com elevada dependência do mercado americano podem buscar alternativas como instalar unidades produtivas nos próprios Estados Unidos, firmar joint ventures ou ampliar centros de distribuição para mitigar o impacto tarifário. Paralelamente, o Brasil poderá tentar intensificar a negociação de acordos comerciais com os EUA que reduzam barreiras não tarifárias e ampliem o acesso a outros mercados – embora essa alternativa, na prática, tenha se mostrado cada vez mais distante.
No Rio Grande do Sul, os efeitos do “tarifaço” têm particularidades relacionadas à estrutura de sua pauta exportadora. Em 2024, o estado vendeu ao exterior aproximadamente US$ 21,9 bilhões, liderados por soja em grão, fumo, farelo de soja, carne de frango e celulose, além de couro, calçados e máquinas. Embora China e União Europeia sejam os principais destinos, os Estados Unidos respondem por 5% a 6% das exportações gaúchas, participação suficiente para que a nova tarifa de 50% gere impactos significativos.
Os setores mais expostos incluem o fumo, cuja produção, concentrada no Vale do Rio Pardo, mantém uma longa tradição de vendas ao mercado americano; as carnes de aves, que devem perder competitividade frente à forte produção doméstica dos EUA; e a soja e o farelo, que enfrentam concorrência direta do próprio produtor norte-americano. O segmento florestal, que engloba celulose e papel, deverá operar com margens mais estreitas em um mercado cada vez mais disputado. Já os setores de calçados e couros, pressionados pela concorrência asiática, terão de investir em diferenciação por qualidade, design e atributos de sustentabilidade para preservar espaço. A indústria de máquinas e equipamentos, por sua vez, pode ser levada a buscar alternativas como montagem local ou parcerias comerciais nos Estados Unidos para manter suas vendas. De forma geral, esses impactos tendem a repercutir no nível de emprego e na geração de renda, sobretudo nas indústrias de transformação ligadas às cadeias agroexportadoras e florestais, além de atingir atividades logísticas, como portos e transporte, que dependem do dinamismo exportador.
Tanto para o Brasil quanto para o Rio Grande do Sul, a resposta a esse cenário exige ações coordenadas. As empresas podem mitigar riscos diversificando mercados, explorando oportunidades em países com menores barreiras, investindo em diferenciação e, quando viável, estabelecendo presença física nos Estados Unidos para reduzir custos de acesso. O governo, por sua vez, pode contribuir com políticas de facilitação comercial, redução de custos logísticos, inteligência de mercado para identificar novas oportunidades e diplomacia econômica ativa para negociar exceções e ampliar acordos comerciais.
No caso do setor de factoring, os efeitos tendem a ser mistos. Por um lado, a perda de competitividade e a redução nos volumes exportados podem diminuir a demanda por antecipação de recebíveis internacionais, afetando a receita das empresas de fomento comercial. Por outro, a maior volatilidade cambial e a necessidade de capital de giro por parte de empresas exportadoras em processo de adaptação podem estimular a busca por operações de factoring, seja para financiar novos contratos, seja para garantir maior previsibilidade de fluxo de caixa em um ambiente de incertezas.
Em síntese, o “tarifaço” representa um teste importante para a resiliência da inserção internacional brasileira e gaúcha. Apesar dos desafios significativos para setores e regiões mais expostos, há espaço para respostas estratégicas que atenuem seus efeitos. O sucesso dessa adaptação dependerá da rapidez e da eficácia com que empresas e governo atuem em conjunto para preservar mercados, conquistar novos destinos e fortalecer a competitividade em um cenário global cada vez mais disputado. Entretanto, caso as medidas de mitigação não sejam eficazes, é provável que se observe retração na atividade industrial e agroindustrial, com repercussões negativas sobre o nível de emprego e a renda no Brasil como um todo. No caso do Rio Grande do Sul, onde grande parte da economia está ligada a cadeias produtivas exportadoras – muitas delas diretamente afetadas pelas tarifas –, o risco de perdas de postos de trabalho e de redução da massa salarial é ainda mais acentuado, afetando não apenas o setor produtivo, mas também o comércio e os serviços que dependem dele. Para o setor de factoring, o lado negativo desse cenário é a possível redução da demanda por antecipação de recebíveis; o positivo é o aumento das oportunidades geradas pela maior volatilidade cambial e pela necessidade de capital de giro das empresas exportadoras.

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