Revisão da meta fiscal e os desdobramentos na economia

Por Carlos Gilbert Conte Filho

            Ao indicar a revisão da meta fiscal para os próximos dois anos, o governo pode ter dado um tiro no pé, já que a credibilidade na política fiscal fica comprometida. Ademais, com um quadro fiscal menos crível e que aumenta a incerteza, o Banco Central pode rever a política de corte dos juros, o que comprometeria o crescimento do produto daqui para frente.

            No Novo Arcabouço fiscal divulgado pelo governo no ano passado, a meta de resultado primário seria de zero em 2024, seguida de superávit de 0,5% em 2025 e de 1% em 2026, sempre com banda de variação de 0,25 ponto percentual para mais ou para menos. Na mudança de meta divulgada no dia 15 de abril, no âmbito do Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO), o governo reviu a meta de 2025 para o resultado zero e traçou uma nova trajetória para o período seguinte, com superávit primário de 0,25% em 2026, 0,5% em 2027 e 1% somente em 2028 (quadro 1). Ou seja, se nada mudar, o superávit de 1% do PIB será alcançado dois anos depois do inicialmente previsto.

Quadro 1 – Meta fiscal entre 2024 e 2026.

 Como eraComo ficou
2024ZeroZero
2025Superávit de 0,5% do PIBZero
2026Superávit de 1% do PIBSuperávit de 0,25% do PIB

Fonte: Ministério da Fazenda (2024).

            Esse novo quadro e as mudanças da meta deixam claro que o governo quer (ou precisará) gastar no limite do arcabouço (utilizando o limite das bandas) em todo esse período sem buscar nenhum tipo de consolidação fiscal. E com a piora do quadro, a trajetória de estabilização da dívida pública é alongada no tempo. Neste ano, pela primeira vez, a PLDO trará um anexo que mostrará a trajetória da dívida nos próximos dez anos. Segundo cálculos do Tesouro Nacional, o estoque da dívida não cairá neste governo, mas somente a partir de 2028.

Dentre os percalços, a meta de 2025 se tornou menos provável por conta das dificuldades do governo em aprovar, no Congresso Nacional, as medidas que ajudariam a alcançar a meta zero este ano e superávit de 0,5% do PIB em 2025. Propostas como a reoneração da folha salarial de 17 setores intensivos em mão de obra e o fim do Programa Emergencial de Recuperação do Setor de Eventos (Perse) encontram dura resistência no legislativo.

            A estratégia da equipe econômica também pressupunha um crescimento mais forte da economia a partir desse ano. Não obstante, o Ministro da Fazenda – Fernando Haddad – chegou a falar, na virada do ano, na expectativa do Federal Reserve (Fed) iniciar o corte de juros em março. Juros menores nos EUA teriam reflexo positivo na economia brasileira (já que a expansão da economia americana acarretaria na melhora das exportações brasileiras). No entanto, os dados mais recentes da inflação no EUA empurraram essa perspectiva para o segundo semestre. Ademais, o aumento da tensão no Oriente Médio ocorrido neste mês é um elemento a mais de incerteza que levam os governos (seja o brasileiro como o americano) a atuar com mais cautela.

            O arcabouço fiscal se condiciona a diferentes intensidades de ajuste. É o que os técnicos chamam de “fator democrático” da regra fiscal. Essa pode ser dura e promover uma rápida queda da dívida, assim como pode servir para um ajuste mais gradual como o que está sendo proposto pelo governo.

            Esse gradualismo ocorre também pela ausência de medidas de contenção das despesas. Avalia-se, nos bastidores, que propostas para rever as regras de gastos mínimos com as áreas de saúde e educação, por exemplo, não serão discutidas antes das eleições.

            Ademais, o impacto da política de valorização do salário-mínimo é outro problema que tem recebido atenção. Esse é um ponto ainda mais difícil de mudar, dados os compromissos de campanha do atual governo.

            Logo, enquanto não há propostas para atacar do ponto de vista estrutural o crescimento das despesas, o governo sinaliza com a revisão de alguns gastos. Nesse sentido, outra novidade do PLDO de 2025 é um anexo listando as despesas. Com benefícios previdenciários e Proagro, a economia esperada até 2028 é de R$ 37,3 bilhões. No entanto, trata-se de um primeiro passo. A intensão do governo ampliar esse trabalho.

            Em suma, mesmo com a mudança prevista a partir de 2025, o arcabouço fiscal continua apontando para uma trajetória de estabilização da dívida pública. Esse caminho, contudo, será um pouco mais gradual de como o governo esperava no início.

O grande senão foi o governo ter sido muito otimista naquele primeiro momento quando do anúncio do Novo Arcabouço e agora ter que rever o que havia sinalizado. O mercado vê com maus olhos mudanças desse tipo. Entende que o governo perde credibilidade na condução das políticas públicas. E a perda de credibilidade resulta na ampliação da incerteza. E um maior nível de incerteza acarreta menos investimentos e, consequentemente, no menor crescimento do produto.  

            Ademais, medidas que indiquem uma piora da situação fiscal do governo podem fazer com que o Banco Central tenha outro tipo de postura na condução da política monetária, leia-se na condução da Selic (atualmente em 10,75% ao ano). Nesse sentido, os próximos eventos (internos e externos) contam. O ambiente internacional está bastante estressado por conta das guerras no oriente médio e no leste europeu. Não obstante, os juros nos EUA e a possibilidade de postergação do ciclo de relaxamento da política monetária por lá, podem ter um impacto negativo por aqui e tendem a gerar um maior impacto no câmbio, o que induz a um processo inflacionário. E a retomada do processo inflacionário pode levar o BC a rever a postura de cortes na Selic.

O Copom tinha sinalizado, na última reunião, mais um corte de 0,5% para o encontro de maio. Contudo, essa projeção pode não se confirmar e, assim, antecipar ou até frear momentaneamente novos cortes da Selic. E um cenário como esse, com o governo de um lado perdendo credibilidade na condução da política fiscal e do outro o BC mais duro na condução da política monetária conduzem, inevitavelmente no aumento da incerteza e, portanto, na queda dos investimentos e do PIB.

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